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Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso

 

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OS REINADOS DE SAUD E FAISAL (1953-1975)

 

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Depois da morte de Abdul Aziz, em 1953, assumiu o trono seu filho Saud, que tinha sido indicado príncipe herdeiro alguns anos antes, num ato político que remontava aos dias de Muhammad ibn Saud e Muhammad ibn Abd al Wahhab. O novo rei Saud não mostrou ser um líder à altura dos desafios das próximas duas décadas. Ele era um perdulário, antes mesmo de se assumir o trono,   e isto se transformou numa questão crucial quando ele passou a controlar as finanças do reino.  Saud pagava elevadas somas para manter a submissão das tribos,   em troca do recrutamento de uma imensa guarda palaciana, o Exército Branco, assim chamado por causa da tradicional roupa árabe que vestiam em lugar dos uniformes militares. As receitas não davam para os gastos de Saud com as tribos, com os subsídios aos vários grupos estrangeiros e com as suas próprias extravagâncias. Em 1958, o rial (moeda saudita) tinha sido desvalorizado quase 80%, apesar de as receitas anuais provenientes do petróleo ultrapassarem a US$300 milhões.

Crescia a frustração com o desperdício, com a falta de desenvolvimento de projetos públicos e instituições educacionais e com os baixos salários da força de trabalho crescente.  As pessoas começavam a ter consciência de uma cultura dualista surgindo na Arábia Saudita. No período de Abdul Aziz, não havia classes privilegiadas: seu primeiro palácio tinha sido feito com os mesmos tijolos usados pelos camponeses, shaykhs e pastores beduínos se chamavam pelo primeiro nome e as roupas do rico e do pobre eram bastante semelhantes.

A insatisfação era geral. Num esforço para desencorajar a formação de posturas críticas, estudantes que freqüentavam faculdades no exterior estavam proibidos de estudar Direito, Ciência Política e áreas afins. Em 1956, trabalhadores da Aramco saudita fizeram uma segunda greve, a primeira tinha ocorrido em 1953.  Saud baixou um decreto real em junho de 1956, proibindo greves futuras sob pena de demissão.

Nas relações externas, Saud seguiu as tendências de seu pai e promoveu a unidade árabe, exigindo, em cooperação com Gamal Abdul Nasser do Egito, a libertação da Palestina. Os laços da Arábia Saudita com o Egito se fortaleceram em outubro de 1955, através de um pacto de mútua defesa. Nasser e Saud ajudaram no financiamento de um esforço para desestimular a Jordânia a assinar o Pacto de Bagdá, patrocinado pelo ocidente. Quando forças francesas, inglesas e israelenses invadiram o Egito, em 1956, por causa da nacionalização do Canal de Suez feita por Nasser, Saud concedeu o equivalente a US$10 milhões ao Egito, cortou relações com a Inglaterra e França e embargou as remessas de petróleo para ambos os países.

As relações Estados Unidos-Arábia Saudita também declinaram nos primeiros anos do reinado de Saud. Os nacionalistas criticaram a cessão da base aérea de Dhahran aos Estados Unidos, chamando de concessão ao imperialismo americano. Em 1954, a missão americana Point Four foi desmanchada.

Em 1957, iniciou-se uma reordenação da política saudita, após a visita de Saud aos Estados Unidos. Em uma conferência com o presidente Dwight Eisenhower, Saud deu o apoio à Doutrina Eisenhower e concordou com a renovação da cessão da base aérea de Dhahran por mais cinco anos.

Mas enquanto as relações com o ocidente melhoravam, com o Egito pioravam. Egito e Arábia Saudita tinham se aproximado por um  interesse comum em obter a independência árabe da intervenção estrangeira não árabe. Além desse ponto, não havia qualquer outra semelhança de objetivos. Nasser tinha deposto o rei do Egito e estava estimulando atitudes revolucionárias em outros países árabes. Suas noções de unidade árabe e socialismo econômico eram repelidas por Saud e por muitos sauditas, que desejavam preservar um reino independente e capitalista. Além disso, os egípcios negociavam com a União Soviética, de quem os sauditas tinham recusado uma oferta de armas e o reconhecimento diplomático por causa do medo do comunismo. A presença de um grande número de militares adidos e professores egípcios na Arábia Saudita causava grande preocupação entre os sauditas de que idéias inaceitáveis pudessem circular no país. Oficiais sauditas ficaram espantados quando a Síria e Egito uniram-se, em 1958, para formar a República Árabe Unida. No entanto, o choque provocado pela notícia da união foi amortecido diante da descoberta de uma suposta conspiração de Saud para subverter a empreitada e assassinar Nasser.

Os membros mais antigos da família real estavam cada vez mais inquietos e inseguros com a tendência de Saud indicar seus jovens e inexperientes filhos para posições importantes no governo, em lugar dos membros mais velhos e mais maduros da família. Eles temiam que essas nomeações significassem um plano para transferir a sucessão para a sua descendência em lugar da prática tradicional de escolha do líder entre os membros mais velhos e mais experientes da família. Esses receios, juntamente com a preocupação com os gastos exagerados e o suposto complô, aumentaram a insatisfação na família a ponto de os membros mais velhos pedirem que Saud renunciasse ao poder em favor de Faisal.

Em março de 1958, Saud editou um decreto real dando a Faisal poderes executivos em questões internas e externas, inclusive planejamento fiscal. Como resultado do início de um programa de austeridade de Faisal, em 1959, que incluía a redução de subsídios para a família real, o orçamento equilibrou-se, a moeda estabilizou-se e a crítica dívida interna resolveu-se.

As reduções no orçamento da casa real irritaram Saud e seu círculo, e o surgimento de uma disputa decorrente do desejo de Saud de conceder controle total de uma refinaria de petróleo no Hijaz a um de seus filhos, fez com que Faisal ficasse cada vez mais cauteloso. Em janeiro de 1961, Faisal e seu Conselho de Ministros apresentaram suas renúncias.

Saud assumiu o posto de primeiro-ministro e indicou um outro irmão, o progressista Talal, ministro das Finanças e Economia Nacional. Um novo gabinete foi formado, composto de vários membros da sociedade educados no ocidente. Havia muita conversa sobre inovações no governo, mas nada que fosse materializado em atitudes concretas. Talal, entendendo que Saud tinha deturpado suas intenções ao dar apoio ao governo, partiu para o Cairo levando com ele vários oficiais da força aérea e seus aviões. Em setembro de 1962, a guerra civil irrompeu no Iêmen e as forças egípcias chegaram para apoiar os revolucionários contra os sauditas que tinham apoiado a destituição do governo real. Naquele momento, a destruição da monarquia saudita parecia iminente.

Em março de 1962, Faisal reassumiu o cargo de primeiro-ministro e ministro do Exterior, em substituição a Saud, que se encontrava nos Estados Unidos para tratamento médico. Em outubro do mesmo ano, os ulama e vários príncipes pediram que Faisal aceitasse o trono mas ele recusou, citando a promessa feita a seu pai de apoiar Saud. Saud tornou-se primeiro-ministro de novo, nomeou Khalid primeiro-ministro substituto e formou um governo. Ele assumiu o comando das forças militares e rapidamente restabeleceu a lealdade e moral.

No mês seguinte, ele anunciou um plano de reformas de 10 pontos. As mudanças incluíam o compromisso de promulgar uma constituição, estabelecer o governo local e formar um judiciário independente com um conselho judiciário supremo composto de membros religiosos e laicos. Ele prometeu fortalecer o Islam e reformar o Comitê de Estímulo à Virtude e Desestímulo ao Vício (também conhecido como Comitê da Moralidade Pública). O progresso deveria ser garantido pela regulamentação das atividades econômicas e comerciais e deveria haver um esforço sustentado para desenvolver os recursos do país. Reformas sociais incluiriam previsões para segurança social, compensação pelo desemprego, bolsas de estudo e abolição da escravidão. Consultas entre Faisal e o presidente Kennedy garantiram o apoio americano aos planos dele. As relações diplomáticas com a França e Inglaterra foram restabelecidas e a dívida contraída com esses países foi paga.

Os projetos de Faisal e a disponibilidade orçamentária necessária para modernizar as forças armadas em razão do envolvimento com o Iêmen significaram que a renda pessoal do rei tinha que ser cortada. Em março de 1964, um decreto real, apoiado pela família real e ulama reduziu os poderes de Saud e seu orçamento pessoal. A resposta de Saud, que estava em viagem pela Europa com uma grande comitiva, foi furiosa. Ele tentou reunir apoio para sua volta ao poder mas a família real e os ulamas ficaram firmes. Em novembro do mesmo ano, os ulamas editaram uma fatwa a respeito do assunto.  Saud foi deposto e Faisal declarado rei. Esta decisão terminou com quase uma década de pressão interna e externa para depor Saud e assegurar o poder e a integridade das forças conservadoras da Arábia Saudita.

Quando Faisal se tornou rei (1964-1975), ele se impôs a tarefa de modernizar o reino. Seus dois primeiros atos oficiais foram direcionados à proteção da nação contra potenciais ameaças internas e externas que pudessem impedir o seu progresso. No primeiro mês de reinado, Khalid, um meio irmão, foi designado príncipe herdeiro, assegurando, assim, que a sucessão não seria perturbada por disputas de poder que quase tinham destruído a hegemonia saudita no passado. Sultan, um outro meio irmão, servindo como ministro da Defesa e Aviação, foi encarregado da modernização do exército e da criação de um sistema de defesa aéreo para proteger o país e suas reservas petrolíferas do possíveis ataques externos ou internos.

Os financiamentos para a Universidade Rei Abdul Aziz, em Jedá, foram substancialmente aumentados e foi aberta a Universidade de Petróleo e Minerais, em Dhahran. Faisal sentiu que, embora não fosse desejável, a influência estrangeira era inevitável enquanto a população permanecesse iletrada e incapaz de assumir posições importantes no país.

Inquieto com a disseminação de idéias republicanas no mundo árabe, que desafiavam a legitimidade da família Saud, em 1965, Faisal convocou uma conferência de cúpula para reafirmar os princípios islâmicos contra a onda crescente de ideologias modernas. Faisal dedicou-se aos ideais islâmicos que ele tinha aprendido na casa de seu avô materno, um descendente direto de Abd al Wahhab, o líder do renascimento da ortodoxia religiosa no século XVIII, na Arábia.  Diferentemente da maior parte de seus meios irmãos, Faisal tinha sido educado em uma atmosfera espartana, e, desde cedo, foi estimulado por sua mãe a desenvolver valores compatíveis com sua liderança tribal. O idealismo religioso de Faisal não diminuiu sua eficácia secular. Para ele, a atuação política era um ato religioso que exigia atenção, dignidade e integridade. O respeito por Faisal cresceu no mundo árabe por causa das mudanças promovidas dentro da Arábia Saudita, da excelente administração das cidades sagradas, e por sua reputação como um inimigo destemido do sionismo e seu poder financeiro.

Embora cauteloso, Faisal introduziu a tecnologia ocidental. Ele era constantemente forçado a lidar com as insistentes demandas de seus parceiros ocidentalizados, que pediam que ele andasse mais rápido e às igualmente insistentes exigências dos ulamas para não ir tão ráppido. Ele escolheu o meio termo não só para acalmar as duas forças mas também porque acreditava seriamente que a correta orientação religiosa aliviaria os efeitos adversos da modernização. Em 1965, por exemplo, um programa de televisão saudita ofendeu os sauditas. Um dos sobrinhos de Faisal chegou ao ponto de liderar um ataque a um dos novos estúdios e mais tarde foi morto num tiroteio com a polícia. Esta tragédia familiar, no entanto, não modificou o apoio que Faisal tinha dado para o projeto de um sistema de rede televisiva.

Durante o reinado de Faisal, iniciou-se um grande programa educacional. Gastos com a educação aumentaram para cerca 10% do orçamento anual. Centros de treinamento vocacional e institutos de educação avançada foram construídos, além das mais de 125 escolas primárias e secundárias construídas anualmente. As demandas femininas, cada vez mais verbalizadas, levaram à criação de escolas primárias para meninas, que foram postas sob rigoroso controle religioso para apaziguar aqueles que se opunham à educação para mulheres. Centros de saúde foram multiplicados.

As questões regionais dentro da península, com exceção do Iêmen, diziam respeito a disputas de fronteira. Ainda que Faisal tivesse feito muito progresso, depois de sua morte a Arábia Saudita ainda tinha questões de fronteiras não resolvidas. Em agosto de 1965, Jordânia e Arábia Saudita chegaram a um conclusão final em relação às fronteiras. Ainda em 1965, a Arábia Saudita também concordou com a definição da fronteira com o Qatar. Um acordo com o Irã, em outubro de 1968, estabeleceu direitos distintos ao Irã e à Arábia Saudita no Golfo Pérsico, e chegou-se a um acordo para desestimular a intervenção estrangeira naquela região. A formação dos Emirados Árabes Unidos, em 1971, não obteve o reconhecimento oficial até ser firmado um acordo sobre uma antiga questão referente ao oásis de Al Buraymi.

O maior problema da Arábia Saudita dentro da península era um acordo para resolver a crise com o Iêmen. Em agosto de 1965, Faisal e Nasser concordaram com um imediato cessar-fogo, com o fim da ajuda saudita aos monarquistas e com a retirada das forças egípcias. No mesmo ano, em Harad, no Iêmen, a Arábia Saudita e Egito patrocinaram uma reunião de representantes iemenitas dos lados opostos. A conferência acabou num impasse e as hostilidades recomeçaram depois da prometida retirada dos soldados egípcios. Os monarquistas reivindicaram grandes vitórias. Os egípcios anunciaram que eles não iriam retirar o remanescente dos soldados e que estavam irritados com o que acreditavam ser uma nova intervenção saudita. A força aérea egípcia bombardeou instalações monarquistas e aldeias no sul da Arábia Saudita, que respondeu fechando os dois bancos egípcios, uma ação respondida, por sua vez, com o seqüestro dos bens sauditas mantidos no Egito.

Saud, então residindo no Egito, fez uma doação pessoal de US$1 milhão à República Árabe do Iêmen (Iêmen do Norte), e transmitiu uma declaração onde falava de sua intenção de voltar a governar "e salvar o povo e a terra sauditas". Vários ataques terroristas contra as residências da família real e aos funcionários dos Estados Unidos e Inglaterra levaram à prisão de um grupo que incluía 17 iemenitas, acusados de sabotagem. Eles foram declarados culpados e decapitados publicamente, de acordo com a lei. As desavenças entre egípcios e sauditas só foram resolvidas na Conferência de Cartum, em 1967.

Como resultado da guerra de junho de 1967 entre Israel e vários estados árabes, as questões entre os estados árabes passaram a ter uma importância secundária em razão do que os árabes chamavam de "ameaça alienígena" de Israel. A influência de Faisal nas conferências árabes continuou crescendo, sua posição fortalecida por causa das grandes receitas, com as quais ele podia cumprir todos os seus compromissos e por sua reputação irretocável como um muçulmano piedoso. O pronunciamento pan-islâmico de Faisal assumiu uma forma concreta depois da guerra de 1967, quando uma nação islâmica, a Jordânia, recebeu uma ameaça externa à sua existência, com o mesmo "poder infiel", Israel, ocupando e retendo Jerusalém, o terceiro local mais sagrado do Islam.

Na Conferência de Cartum, Arábia Saudita, Líbia e Kuwait concordaram em criar um fundo equivalente a US$378 milhões, a ser distribuído entre os países que tinham sofrido perdas em razão da guerra de junho de 1967. A contribuição saudita foi de US$140 milhões. Jordânia e Egito estavam numa situação crítica do ponto de vista financeiro. O dinheiro serviria para aliviar esta situação e também para sustentar o poder político de barganha. O Egito não poderia mais continuar se envolvendo com a guerra no Iêmen, e Nasser e Faisal concordaram com um compromisso proposto pelo Sudão. A agressão militar contra Israel não foi citada mas os participantes concordaram em não reconhecer ou fazer a paz com Israel e continuar a trabalhando pelos direitos dos palestinos.

Um incêndio na mesquita de Al Aqsa, em Jerusalém, em agosto de 1969, levou à Conferência de Cúpula de Setembro de 1969, em Rabat, no Marrocos. Os representantes concordaram em intensificar os esforços para assegurar uma imediata retirada das forças militares israelenses nos territórios ocupados e a busca de uma paz honrosa.

Com o aumento do seu poder econômico, em julho de 1973 a Arábia Saudita ameaçou reduzir a produção de petróleo se os Estados Unidos não igualassem o tratamento dispensado ao Egito e a Israel. A ameaça foi feita durante a guerra de outubro de 1973, entre Israel e os dois estados árabes, quando a OPEP impôs um aumento geral nos preços do petróleo e um embargo aos principais consumidores de petróleo que apoiavam Israel ou eram aliados de seus defensores. O embargo foi um protesto político que pretendia a retirada israelense do território árabe ocupado e o reconhecimento dos direitos do povo palestino.

Na conferência árabe realizada na Argélia, em novembro de 1973, a Arábia Saudita concordou com todos os participantes, com exceção do representante da Jordânia, em reconhecer a OLP como a legítima representante do povo palestino. O rei Hussein, da Jordânia, se recusou a participar mas foi incentivado por Faisal a participar das reuniões que seguiram no ano seguinte, em Rabat. Nesta reunião, Hussein deu sua aprovação relutante à proposta de que a OLP deveria ser a negociadora com Israel a respeito da criação de uma entidade palestina no território recém ocupado por Israel. Em troca, a Arábia Saudita prometeu a Hussein US$ 300 milhões por ano, nos próximos quatro anos.

Como resultado dos acordos de 1973, que triplicaram o preço do óleo cru em resposta à guerra israelo-árabe, a Arábia Saudita teve as receitas aumentadas para investir em programas domésticos. No entanto, a saúde precária de Faisal, o excesso de trabalho e a idade avançada o impediram de formular um plano de desenvolvimento coerente antes de ser assassinado em março de 1975. Ele foi baleado por seu sobrinho, um irmão descontente do sobrinho morto em 1965, no incidente na televisão.

 

 


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